Amargura?
Estavam marcados no rosto os traços de amargura
Cada ruga contava uma história de dor e sofrimento
Mas o olhar, esse era vazio, sem expressão
Só deixando antever ainda um resto de ternura
Quando afagava o cabelo maltratado do rebento
Que lhe puxava os trapos velhos, pedindo protecção
Quem é? Não sei e ela própria também já não o sabe!
Já foi criança, já teve um nome, e já também sonhou
Sonhou com uma família que tinha um tecto e tinha pão
Hoje, é apenas mais um sem abrigo perdido na cidade
A cidade que um dia, há muito tempo, a rejeitou
A cidade onde hoje dorme embrulhada num cartão
É este o país onde eu vivo e me sinto acomodado
Porque não tenho fome, tenho um nome, e tenho lar
Porque olho esta mulher e sinto apenas compaixão
E em vez disso, eu deveria sentir-me revoltado
Não só lamentar, mas também me indignar
Porque no meu país gente sem nome não tem pão.
XICO MENDES
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